terça-feira, 12 de outubro de 2010

Carta a Pedro Malan

Senhor ministro Pedro Malan,

               Guardo em meu baú de documentos pessoais, coligidos ao longo de 25  anos de jornalismo político,  algumas cartas suas, escritas do alto posto de Ministro de Estado da Fazenda, que o senhor ocupou por oito anos, e no qual prestou bons serviços ao Brasil.  Nunca achei que o senhor estivesse tentando cercear minha liberdade de expressão quando se dava ao trabalho de contestar minuciosa, enfática e frequentemente minhas  opiniões ou comentários na coluna Panorama Político de O Globo. Estas cartas foram sempre registradas na coluna, com o resumo do que diziam.   Hoje, se algum ministro começar a escrever cartas de contestação a  um colunista,  será chamado de autoritário e suas cartas serão tidas como libelos contra a liberdade de imprensa.
                Mas vejo que o ministro não me esqueceu, embora eu esteja recolhida às minhas tarefas, que são da esfera pública,  não da esfera política ou governamental, como o senhor erroneamente entende.  Escrevendo sobre o primeiro turno,  na edição do último dia 10, sexta-feira, do jornal O Estado de São Paulo, o senhor se refere à suposta busca de um pleito plebiscitário pelo presidente Lula, afirmando em seu artigo "Diálogo de Surdos?":

"Não é de hoje o desejo presidencial: "Lula quer uma campanha de comparação entre governos, um duelo com o tucano da vez. Se o PSDB quiser o mesmo... ganharão os eleitores e a cultura política do país." Assim escreveu Tereza Cruvinel, sempre muito bem informada sobre assuntos da seara petista, em sua coluna de janeiro de 2006. Não acredito que a "cultura política" do País e seus eleitores tenham muito a ganhar - ao contrário - com essa obsessão por concentrar o debate eleitoral de 2010 numa batalha de marqueteiros e militantes.

          Mas em 10 de Janeiro passado o senhor já dera provas de não me ter esquecido, exumando, não pela primeira vez, escritos meus do passado.  Seu artigo "Equilibrado delírio?", no mesmo jornal, começava reproduzindo o mesmo trecho, agora citado, de uma  coluna minha de 2006. Vejamos:

"Lula quer uma campanha de comparação entre governos, um duelo com o tucano da vez. Se o PSDB quiser o mesmo... ganharão os eleitores e a cultura política do País." Assim escreveu Teresa Cruvinel, sempre muito bem informada sobre assuntos da seara petista, em coluna de um janeiro de outro ano eleitoral - 2006 -, exatos quatro anos atrás.Trago de volta essa lembrança por três razões: primeiro, porque a jornalista ocupa hoje importante posição no esquema de comunicação oficial do atual governo. Segundo, porque essa tem sido e, ao que tudo indica, será a linha mestra da campanha do governo e de sua candidata à Presidência. Terceiro, porque, como escrevi à época, não acredito que a "cultura política do País" e seus eleitores tenham algo a ganhar - ao contrário - com uma obcecada tentativa de concentrar o debate eleitoral de 2010 numa batalha de marqueteiros e militantes brandindo estatísticas. ".

                  Tão frequentemente citada em seus artigos,  e com intenções que precem tão claras, tenho o dever de responder-lhe, ministro.   Faço-o aqui mesmo, neste democrático espaço da Internet,  evitando um infrutífero pedido de espaço ao jornal que publica seus artigos. Gostaria de dizer-lhe que: 

1. O ministro é homem inteligente demais para ficar  fazendo um "copiar e colar" de seus próprios artigos ou de velhas colunas de terceiros.

2. Seu gasto de chumbo comigo me lisongeia mas sou pássaro pequeno.

3. Não integro o "esquema de comunicação oficial do atual governo". Dirijo a EBC, empresa gestora da televisão pública, a TV Brasil.

4.  Vejo em sua exumação de escritos meus não uma implicância pessoal, que seria tola,  mas sua forma de combater e tentar desqualificar o Sstema Público de Comunicação gerido pela EBC.  Há quem finja não saber do que se trata. Ele está previsto no artigo 223 da Constituição e existe em toda democracia que se preze. O ministro, cidadão do mundo, cosmopolita,  sabe o que é uma  televisão pública. Sabe que ela existe para  oferecer a programação diferenciada, cultural, complementar. Aquilo que a outra, sendo um negócio, não pode oferecer.

5. Lembrando-se tanto de mim, convido o ex-ministro a frequentar  este blog, onde é a cidadã Tereza Cruvinel (com z, por favor)  que se manifesta, não a diretora-presidente da EBC. Embora aqui também eu observe, por coerencia,  as normas de isenção, apartidarismo e pluralismo que devem pautar os canais públicos.  Não sou uma coisa lá e outra aqui.

6. Por fim, ministro, posso ter criticado muitos aspectos de sua política econômica mas reconheço que o senhor serviu ao pais com espírito público.  Gostaria que também tivesse uma avaliação honesta de meu modesto mas correto trabalho profissional.

Sinceramente.
Tereza Cruvinel


2 comentários:

  1. Excelente, Tereza. Mas o Malan já morreu e não sabe. Ele é que é pássaro pequeno, cada vez menor.

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  2. Excelente seu artigo, Tereza (com "Z", por favor). Elegante, coerente - posto que, reconhecedor do papel estrelado pelo ex-ministro no governo de FHC - como cabe a um profissional desta área, a comunicação, que, dizem, deve ser sempre objetivo.
    Edneide

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