segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O tempo de Lula e o tempo que virá

Compartilho com vocês o artigo publicado no Correio Braziliense do dia 01 de janeiro de 2011


Estou mergulhada na edição de A era Lula, série documental que a TV Brasil exibiu na última semana de 2010. Com uma valorosa equipe que sacrificou as folgas de fim de ano para finalizar o trabalho, revisito as imagens deste período extraordinário para o Brasil. Saio da ilha e venho ao computador escrever o artigo. Como desejar feliz ano-novo aos leitores oferecendo alguma reflexão não tediosa?
Falarei das expectativas em relação à presidente Dilma ou compromissos que, como todo mundo, eu também fiz comigo mesma para o ano que se inicia?

Prometo fazer dieta, não faltar à academia, reduzir a carga de trabalho e o estresse, ficar mais em casa e com a família, viajar mais com meu filho. Ir mais ao cinema e cuidar mais de meu jardim. Contemplar mais vezes o entardecer sobre o lago, o sol morrendo atrás da Ponte do Bragueto enquanto as garças voejam e um casal de quero-quero faz rasantes sobre o gramado. Eu prometo, mas sei que não resisto aos chamados da vida embora esteja decidida a reduzir a velocidade.

Venho para o computador, mas as imagens que deixei na ilha não se despregam de mim. E elas me dizem que preciso falar, ainda um pouco mais, destes anos felizes e sofridos, estimulantes e decepcionantes, extraordinários e banais, esses anos irrepetíveis, depois dos quais nada mais será como antes no Brasil. Já falei do legado de Lula no artigo de dezembro, já dirigi uma série de TV falando disso.
Agora estou me referindo a um tempo, não exatamente a um governo. Um tempo em que Lula esteve no centro da nossa vida e isso vale para os que o admiraram como para os que o odiaram, para os que o apoiaram como para os que desejaram seu fracasso e mesmo sua derrubada. Um tempo é mais que um governo embora todo governo faça parte de um tempo.

O tempo em que vivemos sob Lula foi especial pelas razões já tão apontadas: porque alguém nascido do povo finalmente governava para o povo e fazia isso de modo absolutamente natural, com uma autenticidade irritante para os cultores do poder representado; porque, sem tisnar interesses, seu governo moveu o equivalente a uma França, fazendo com que 50 milhões de brasileiros ascendessem na escala social, para desgosto dos que desconhecem completamente o sentido da pobreza; porque, apesar da ampla aprovação popular, foi quase regra, nos meios de comunicação, retratar Lula como bravateiro tosco, senão como farsante; porque, apesar destas crônicas domésticas, lá fora existiu outro Lula, não apenas líder do Brasil e de nossa região, mas portador de nova mensagem na política internacional, que resultou em novos consensos e novos instrumentos de decisão multilateral, como o G-20 e a Unasul.

Um Lula que recebeu prêmios prestigiosos. O jornal francês Le Monde o escolheu como Homem do Ano em 2009. Logo depois o diário espanhol El País deu-lhe o título de Personagem Ibero-Americano e o Financial Times o incluiu entre as 50 personalidades que moldaram a década. O Forum Econômico de Davos deu-lhe o título de Estadista Global. Nem tudo foi resolvido em seu governo nem faltaram momentos de decepção. Faltou uma reforma política, avançamos pouco na saúde e na educação, não enfrentamos alguma questões delicadas, entre elas, a impunidade dos torturadores. Mas os tempos que vivemos sob Lula ficaram também marcados por grandes mesquinharias que devemos nos  esforçar para superar, agora que ele saiu da Presidência para voltar às ruas, como disse. Sob Lula, conhecemos o ódio de classe e, de certa forma, aos pobres. Chamaram o Bolsa-Família de bolsa-esmola.

Os que nunca acenderam uma lamparina desdenharam o programa Luz para Todos. O preconceito contra os nordestinos aflorou, sobretudo após a vitória de Dilma. Sob Lula, o jornalismo abandonou seus melhores cânones, colocou de lado as regras da boa técnica que fizeram da imprensa brasileira, sobretudo nos tempos da transição da ditadura para a democracia, uma das melhores do mundo. Sob Lula, a conjunção adversativa “mas” passou a frequentar as manchetes de jornais quando a notícia era positiva.

Agora vamos ser governados por uma mulher e, no que pese a novidade de gênero e o apoio de Lula, ela é branca, bem-nascida e tem curso superior, o que pode lhe render alguma boa vontade, pelo menos no início. Devemos aproveitar a lua de mel para deixar para trás, definitivamente, as torpezas e mesquinharias cometidas contra Lula e sob Lula, em grande parte porque lhe faltava um berço, um sobrenome, um diploma de curso superior e aquelas boas maneiras que só a elite conhece. A oposição pode ser mais eficiente sendo menos raivosa. A imprensa pode ser crítica sem ser preconceituosa. Seremos mais felizes com menos idiossincrasias. Tenhamos todos um feliz 2011.

3 comentários:

  1. Muito bom o texto Tereza!
    Você resumiu bem o que foi o ódio daqueles que torciam para que nada disso desse certo...
    Mas uma coisa eles não contavam: a esperança venceu os medos e pouco a pouco o povo começou a ver com seus próprios olhos... sem precisar de ter o crivo e a "inteligência" global. Parabéns por sua boa postura jornalística e de administradora.

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  2. Do jeito que fala já estou quase com peninha do coitadinho...do coitadinho que nunca soube de nada. Ah! mas pra não ser preconceituosa, pra não dizerem que estou perseguindo um torneiro mecanico que deixamos ser presidente...nem vou citar o mensalão ...ok? Feliz 2011 pra todos nós.

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  3. Nao podemos dizer que o governo Lula foi de todo ruim, mas acredito que, por ele ter dado continuidade ao que vinha sendo feito, foi um bom governo. Mas acredito que qualquer um que fosse presidente e desse continuidade ao que vinha sendo feito há um bom tempo, daria, pelo menos o mesmo resultado.

    Atribuir ao Lula o avanço do Brasil nos últimos 8 anos eu acho um pouco de exagero. Digamos que ele não atrapalhou o bom andamento do progresso, como muitos acreditavam que iria ocorrer.

    Diante de fatos, não temos como dizer que o governo não prestou, mas acredito que poderia ter sido feito muito mais pelo Brasil do que foi feito. Um dos problemas do país, não digo nem que seja do governo, é a mania de dar o peixe e não ensinar a pescar. Esse monte de bolsa-não-sei-o-que-lá, faz com que os pobres façam esforços para ganhar mais e mais bolsas. O certo seria dar bolsas de forma a estimular a criação de um negócio ou as condições iniciais de procurar uma forma de melhorar a renda familiar. Mas essas bolsas são eternas e infinitas. Para uma família de preguiçosos, é mais fácil ter 5 filhos e ganhar não sei quantas bolsas para manter esse pessoal todo, do que se cuidar, ter poucos filhos e fazer toda a família crescer.

    Além disso, a máquina do governo é uma vergonha de tão cara e ineficiente. Pagamos fortunas em impostos, tanto impostos diretos, como IR, IPTU, IPVA como indiretos, esse monte de coisa que encarece tanto o preço de quelquer tipo de produto aqui no Brasil. Além disso, ainda temos que pagar por uma educação, saúde, segurança e qualquer outro tipo de serviço que o governo deveria prover utilizando impostos.

    A sonegação no Brasil é, de certa forma, uma forma de sobrevivência para muitas empresas e famílias. Não acho que seja certo, mas devido a todo esse cenário do Brasil, não podemos julgar como criminosos quem toma esse tipo de atitude por questão de sobrevivência.

    Toda essa questão de impostos e má utilização de verbas não vem apenas do governo Lula, mas o se governo teve diversas chances de mudar alguns desses pontos e fez o contrário, se envolveu dizendo que não sabia de nada, que não tem nada a fazer, que é assim mesmo e que temos que elevar os impostos.

    Enquanto milhões de famílias recebem R$40 por mês de bolsa-alguma-coisa e alguns políticos mamam nas tetas do governo, outra família perde um ente querido no corredor de um hospital, um filho vira traficante, o outro de 20 anos não sabe ler, uma família morre na estrada porque ali tinha buracos e teu irmão morre com um tiro na cabeça porque um trombadinha filha-da-puta queria o tênis dele.

    Eu gostava quando eu saía na rua para brincar, andava a pé e saía a noite sem ficar ansioso com a minha segurança e a do pessoal que andava comigo. Nos EUA, Canadá e Europa eles ainda podem fazer isso, a gente não pode mais.

    Essa é a era, o tempo do governo Lula? Acho que poderia ter sido muito melhor.

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